quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Um ponto para aliviar a luta

Drama de mãe de dois cadeirantes pode ser amenizado com alteração de trajeto de linha sugerida pela Justiça à BHtrans. Maria José precisa andar quatro quarteirões a pé para chegar à fisioterapia após descer do Ônibus. História já foi relatada pelo EM. O cotidiano de Maria José Almeida Santos Ribeiro, de 31 anos, nunca foi como um mar de rosas. Mas essa quitandeira, que vizinhos garantem ser de mãos cheias, jamais se curvou às dificuldades enfrentadas por uma mãe de dois garotos cadeirantes – Caio, de 8, e Vítor, de 4. Em busca de um futuro melhor para os filhos, se tornou um exemplo de mulher. Talvez não seja apenas coincidência o fato de ela carregar na certidão de nascimento os nomes da mãe e o do pai de Jesus. Mãe com seus dois filhos cadeirantes. Eles estão embarcando em um ônibus com a ajuda do trocador. Um dos filhos utiliza a cadeira de rodas, enquanto o outro é carregado pela mãe. De terça a sexta-feira, Maria José encara uma longa viagem do Bairro Tancredo Neves, na periferia de Ribeirão das Neves, na Grande BH, ao Mangabeiras, Região Centro-Sul de Belo Horizonte, para levar as crianças à fisioterapia. O trajeto é feito em dois ônibus. Ainda há uma caminhada de quatro quarteirões, sendo dois numa subida íngreme. O desafio fica maior para quem empurra um filho numa cadeira de roda e carrega o outro no “canguru”. “Vítor, que vai no meu colo, pesa 13 quilos. As costas doem todos os dias”, revela. A história de Maria José, Caio e Vítor foi relatada pelo EM em abril de 2014. Agora, a luta da família volta a ser notícia por um motivo que rendeu um largo sorriso na quitandeira: a BHTrans estuda a viabilidade de alterar o itinerário da linha 4108 (Pedro II/Mangabeiras). O novo caminho diz respeito a apenas quatro quarteirões. Pode parecer uma mudança irrisória para muitos usuários do transporte coletivo, mas trata-se justamente das quadras que dona Maria José tem que caminhar entre o ponto de ônibus e a Associação Mineira de Reabilitação (AMR). “Para piorar, há coletivo que não tem elevador para subir e descer a cadeira. Há até motorista que não para no ponto. É humilhante! Cheguei algumas vezes atrasada à fisioterapia e, por causa disso, meus filhos correram o risco de perderem a vaga na AMR. Eles precisam dos serviços dos profissionais de lá”, justifica Maria José. Oficialmente, a mudança depende de condicionantes, como a aprovação da comunidade e intervenções nas quatro quadras, sobretudo pinturas de faixas para travessia de pedestres e instalação de pontos de ônibus. Extraoficialmente, entretanto, tudo indica que o itinerário será alterado. Tanto que a autarquia informou ontem que, se não houver contratempo, o novo trajeto será implantado na segunda quinzena de outubro. Na prática, trata-se de uma vitória de Maria José. Aliás, dela e de dezenas de famílias que dependem da AMR e, por algum tipo de dificuldade de locomoção, enfrentam uma lenta caminhada entre o ponto do 4108 – na Avenida Agulhas Negras – e a AMR – na Rua Otávio Coelho de Magalhães. Mas a provável mudança é consequência de uma situação que a mãe de Caio e Vítor não gosta de recordar. Há alguns anos, o coletivo em Ribeirão das Neves que ela usa para chegar ao Centro de Belo Horizonte arrancou do ponto com um dos filhos a bordo. “O outro ficou para trás”, conta Maria José. A quitandeira procurou a Defensoria Pública de Minas Gerais. Resultado: uma ação por dano moral foi ajuizada contra a empresa do coletivo e a BHTrans. Representantes da firma e da autarquia da prefeitura foram convocados pelo juiz. O defensor público Estevão Carvalho, coordenador da área especializada em assuntos envolvendo idosos e deficientes físicos, explica que o magistrado aproveitou a audiência para uma sugestão aos réus: “Orientou que o advogado da BHTrans solicitasse aos técnicos da autarquia a viabilidade de mudança no itinerário (de forma a beneficiar dona Maria José e os filhos)”. A audiência, em princípio para discutir apenas o dano moral, já teve resultado prático. A BHTrans convidou a quitandeira para duas viagens em ônibus que transitam pelo Mangabeiras. Durante os trajetos, ela expôs observações sobre a linha. As sugestões foram anotadas pelos especialistas. Até o fim de outubro, acredita a quitandeira, pelo menos parte do seu drama – e de outras tantas famílias – será amenizada. DIFICULDADE A ação por dano moral ainda não foi julgada pelo juiz. Enquanto aguarda a sentença, Maria José luta contra outros problemas. As duas últimas contas da energia elétrica de sua casa, nos valores de R$ 112,82 e R$ 127,49, ainda não foram pagas. “Corro o risco de a Cemig cortar a luz. Estou sem dinheiro, porque o forno que uso para fazer as roscas e os biscoitos que vendo queimou. Não dá para consertá-lo mais, pois é bem antigo. Um novo custa em torno de R$ 500. Não tenho esse dinheiro no momento”, lamentou. O defeito no forno trouxe outro problema à família: a quitandeira ficou sem dinheiro para comprar a quantidade necessária de fraldas para o caçula. Trata-se de Paulo, de 1. Diferentemente de Caio e Vítor, o garoto nasceu sem a mobilidade comprometida. Mas ela não desanima. A fé de Maria José parece mover montanhas. Um dia, ela acredita, todo o esforço será compensado.

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