quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

Sem diminuir salário, TRT-15 reduz jornada de agente do Detran para cuidar de filho com deficiência

11ª Câmara do TRT com sede em Campinas (SP) julgou caso. Funcionário do órgão é de Caçapava (SP) e cuida do filho com paralisia cerebral.
Por Patrícia Teixeira, G1 Campinas e Região
A 11ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, com sede em Campinas (SP), determinou que um funcionário do Detran-SP tenha a jornada de trabalho

reduzida em 50%, sem prejuízo salarial, para que ele cuide do filho com paralisia cerebral. O órgão ainda pode recorrer.

O caso não tem precedentes no estado de São Paulo, informou ao G1 a advogada Edemara Landim do Nascimento. Para conseguir vitória no processo, decisões

de municípios pelo Brasil e decisões da União foram usadas para fundamentar o pedido à Justiça.

"Não é comum. Nós já temos leis que regulamentam isso em âmbito nacional e em âmbito municipal, em algumas cidades. Em Caçapava temos leis que regulamentam

isso, mas no estado não existe. Foi uma vitória e é inédito. Porque todas as pessoas que têm filhos deficientes podem se beneficiar", afirma.

O processo teve início em 2016 e a decisão em segunda instância, consolidada na publicação do acórdão em 26 de janeiro, foi um alívio para Marcio Fimiani

Melli, de 43 anos.

Bloco de citação
"A expectativa de vida dele é incerta. Tenho que fazer alguma coisa agora. Ia esperar uma lei? Não ia dar tempo", desabafa o pai.
Fim do bloco de citação
Felipe, filho do funcionário do Detran-SP, quando bebê. Criança foi criada sem a  mãe desde os 4 anos de idade. (Foto: Marcio Melli/Arquivo pessoal)
'Comportamento de bebê'

Concursado, ele trabalha como agente estadual de trânsito no Detran de Caçapava (SP) desde 2014 e tem a guarda do filho, Felipe, desde os 4 anos de idade.

Atualmente, o jovem tem 21 anos e é dependente do pai.

Bloco de citação
"Felipe tem má formação cerebral, do sistema nervoso central, doença congênita que não tem diagnóstico. É fisicamente normal, mas o cognitivo dele é comprometido.

Ele tem o comportamento de um bebê de 6 meses, que vc precisa dar comida, usa fralda", conta o pai.
Fim do bloco de citação

O acórdão determina o imediato cumprimento da decisão, sob pena de multa diária de R$ 1 mil, reversível em favor do trabalhador. Segundo Melli, a decisão

já foi colocada em prática pelo Detran.

"Comecei a fazer a redução de jornada há menos de um mês. Não é só cuidar, estar do lado dele. Tem toda a logística, tem que levar no dentista, no médico,

levar pra dar uma volta, ir no supermercado. Ninguém lembra dessas coisas, ele não fica sozinho".

Marcio conseguiu na Justiça o direito de ter a jornada de trabalho no Detran-SP reduzida para cuidar do filho com paralisia cerebral (Foto: Márcio Melli/Arquivo

'Direitos humanos'

No processo, de acordo com o Tribunal, o Detran chegou a recorrer em primeira instância alegando que o pedido do funcionário não tinha previsão legal,

mas o desembargador João Batista Martins César, relator do acórdão, buscou a Constituição Federal como base para a sua decisão. Salientou que "os direitos

humanos representam o norte a ser perseguido pela nação".

César determinou que "a redução da jornada de trabalho do reclamante, sem qualquer prejuízo salarial, e sem a necessidade de compensação, é de rigor, como

forma para garantir a efetiva inserção social da pessoa com deficiência, notadamente no que toca à dignidade da pessoa humana, visando sua educação, convívio

familiar, bem como os deveres de guarda e cuidado que a família, a sociedade e o Estado devem garantir".

O jovem, filho do funcionário, sofre crises de epilepsia, distúrbios neurovisuais e tem crises convulsivas graves e diárias, informações que também foram

consideradas e pontuadas pelo juiz no acórdão.

Bloco de citação
"É uma maneira do Estado se responsabilizar com relação às nossas tributações. Acho que todo mundo deveria ter a redução dos tributos de maneira prática.

A gente sempre sente o abandono do Estado. Nesse caso me sinto menos abandonado", afirma Marcio Melli.
Fim do bloco de citação
Caso foi julgado no TRT-15, em Campinas (Foto: Denis Simas/TRT 15)

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