sábado, 24 de fevereiro de 2018

Gabriel Bonfim, artista visual: "Deficientes visuais dizem poder ver de novo"

Paulistano radicado na Suíça, que está no Rio acompanhando a sua exposição ‘De fotografia à Tactography’, no Centro Cultural Correios
POR NELSON GOBBI
"Uma das minhas inspirações [...] foi uma amiga de escola, que era deficiente visual e sofria um bullying muito agressivo", diz o artista visual Gabriel


“Nasci em São Paulo, em 1990 e me mudei para a Suíça em 2013. Lá, desenvolvi com uma empresa belga uma tecnologia que transforma fotos em objetos 3D. Isso


permite que cegos também compreendam as imagens".

gos também compreendam as imagens".

Conte algo que não sei.

Uma das inspirações para a criação da Tactography, além do (tenor italiano) Andrea Bocelli, que fotografei em 2014, foi uma amiga de escola, que era deficiente


visual e sofria um bullying muito agressivo. Derrubavam o lanche dela da mochila, tornavam a vida escolar dela muito mais difícil do que já seria por ser


cega. O nome dela é Marcela Trevisani, e hoje é pianista e dá aula para crianças e jovens com deficiência.

Como começou sua relação com a fotografia?

Veio de uma necessidade de desenvolver um trabalho artístico. Comecei a fazer Direito porque já trabalhava em um escritório de advocacia e parecia o caminho


mais óbvio. Foi quando peguei uma câmera semiprofissional emprestada com um amigo para tentar desenvolver um trabalho. Até que, aos 21 anos, juntei um


dinheiro para comprar uma passagem para Amsterdam e fui passar três meses trabalhando lá.

Como foi a experiência?

Foi uma loucura, fiquei na casa de um conhecido que só tinha visto duas vezes. Não tinha noção do que era o custo de vida na Europa, o dinheiro que achava


suficiente para os três meses acabou no primeiro. Aí fui com a câmera para as ruas, procurar brasileiros para fotografar. Assim consegui me manter e montar


meu portfólio.

E quando começou a desenvolver a tecnologia da Tactography?

Já morava na Suíça desde 2013, e comecei a pensar em obras que permitissem a acessibilidade. Geralmente elas são mais ligadas às esculturas, e queria algo


dentro da minha área. Uma tecnologia que imprimisse imagens, de forma a passar o máximo de informação possível.

Como é o processo?

É uma impressão de resina líquida, que cai numa forma, com as dimensões das minhas molduras. Depois, vem um laser por cima, solidificando a superfície


a partir das imagens escaneadas. Inicialmente tentei com uma empresa Suíça, e mandava os projetos para serem testados em institutos de cegos. Mandei também


para o Andrea Bocelli, com a série de fotos que fiz dele, mas jamais imaginei que ele me daria um retorno. Para minha surpresa, ele respondeu e foi importantíssimo


para o processo.

Como foi este retorno?

Ele me disse o que precisava ser corrigido, o que não funcionava. A empresa suíça não conseguiu fazer os ajustes e indicou a empresa belga, que conseguiu


chegar ao resultado atual.

As imagens em Tactography foram exibidas em São Paulo e estão em cartaz no Rio até março. Como é a reação do público?

Os deficientes visuais ficam emocionados, muitos dizem que conseguem ver de novo e que é como se as imagens fossem construídas dentro da cabeça e permanecessem


lá por um tempo. É uma coisa incrível.

Na exposição do Rio, você começou a oferecer vendas para o público sem deficiência. O que eles dizem da experiência?

É uma resposta até certo ponto engraçada, porque geralmente eles não ficam muito tempo com a venda no rosto. Elas têm curiosidade, mas parece que ficam


com um certo nervosismo por não enxergar. Normalmente, não passam por mais de duas imagens vendados. Eu mesmo, quando percorri a exposição com a venda,


demorei um pouco para identificar todas as fotos, mesmo conhecendo cada uma delas. Mas a proposta é exatamente esta, que seja algo não só para deficientes


visuais, que coloque todas as pessoas no mesmo patamar.

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