quarta-feira, 31 de julho de 2019

Loja faz bonecos negros, com down, cegos, vitiligo e lábio leporino

Peças inclusivas não têm estereótipos e são criadas por três irmãs empreendedoras que sentiam falta de brinquedos afros na sua infância

As palavras fortes e de empoderamento da avó materna, Maria Francisca Henrique, ecoam até hoje na cabeça das três irmãs: Joyce Venancio, Maria Cristina

Venancio e Lucia Venancio. “Foi sensacional nascer na família que nascemos. Tivemos pais conscientes e avós fundamentais para toda a nossa formação, principalmente

a vovó, que sempre nos encorajou a sermos nós mesmas e nunca nos intimidarmos por nossa cor”, diz Joyce.

Hoje, empresárias e donas da Loja Preta Pretinha, que faz bonecos inclusivos, entre eles, negros, com síndrome de down, cegos, amputados, com vitiligo,

elas conquistaram seu espaço e brigam para que outras crianças tenham a mesma inspiração que tiveram.

Início do grupo Boneca boliviana Mariah

Divulgação/Preta Pretinha
Boneca boliviana Mariah
Divulgação/Preta Pretinha
Fim do grupo

Joyce conta que os pais trabalhavam e a avó cuidava das crianças da família. “Ela aproveitou diversos momentos para conversar sobre o que nós representávamos

para a família e sobre os obstáculos que iríamos enfrentar na vida por sermos negras. Frisava bastante que éramos lindas, inteligentes e nos incentivava

a estudar e guardar dinheiro para frequentarmos os melhores restaurantes sem dar atenção à cara feia de ninguém”, fala Joyce.

Infância quase sem bonecas negras

Na infância, a empreendedora questionava muito a avó e a mãe sobre a ausência de bonecas negras. “As poucas bonecas negras que apareciam no mercado tinham

traços de brancas. Eu e minhas irmãs não nos identificávamos com elas. ”

Início do grupo Boneco Tadeu com dread

Divulgação/Preta Pretinha
Boneco Tadeu com dread
Divulgação/Preta Pretinha
Fim do grupo

Joyce lembra que um dia chegou em casa chorando porque queria uma boneca parecida com ela. A avó, sensibilizada, mesmo sem ter o “dom para fazer uma boneca”,

decidiu arriscar e produzir uma peça. Comprou a cabeça de uma boneca branca de plástico, tingiu uma meia de seda de marrom, vestiu na peça, que ficou bem

modelada parecendo a pele da boneca, pintou o rosto, customizou o corpo com tecido e enchimento. E pronto!

“O dia que levei na escola foi uma festa. Algumas crianças gostaram, outras falaram que era feia. Por ter a autoestima bem trabalhada em casa, eu não me

intimidei. Desde então, eu e minhas irmãs falávamos que quando adultas teríamos uma loja de bonecas negras. ”

As meninas cresceram, cada uma seguiu sua carreira e em 2000 se uniram para abrir a Preta Pretinha, na Vila Madalena, zona oeste de São Paulo.

Peças inclusivas, sem estereótipos

A loja é conhecida por comercializar bonecos inclusivos. Lá é possível encontrar bonecos negros (com dread, trança raiz, black power etc.), com síndrome

de down, cegos, amputados, vitiligo, fenda labial (também conhecido como lábio leporino), ruivo, oriental, castanho… “Produzimos bonecos de todos os estilos

e tamanhos e percebemos que muitas pessoas idosas também amam as nossas peças. ”

Início do grupo Boneco cego com cão-guia

Divulgação/Preta Pretinha
Boneco cego com cão-guia
Divulgação/Preta Pretinha
Fim do grupo

Joyce conta que as bonecas da Preta Pretinha não são estereotipadas e são produzidas com tecidos de boa qualidade. “As pessoas tinham uma visão errada

de bonecas negras como sendo bruxinhas, nega maluca, nega flor. Nós quebramos tudo isso. Nosso papel foi realmente de inclusão. ”

Segunda a empreendedora, a loja é frequentada por educadores, professores, juízes da Vara da Infância e da Família e mídia.

“Esse público acabou fortalecendo bastante nosso trabalho. Em algumas visitas eu cheguei a ouvir professores reclamando que as crianças exigiam que falassem

sobre a africanidade nas escolas. Sempre que conseguia, interferia e falava sobre a importância de se falar sobre grandes nomes de negros que fizeram o

Brasil, como escritor e historiador Teodoro Sampaio. Muitos não sabem que ele era negro. ”

Início do grupo Vovô e vovó da Preta Pretinha

Divulgação/Preta Pretinha
Vovô e vovó da Preta Pretinha
Divulgação/Preta Pretinha
Fim do grupo

Bonecos a partir de R$ 10

A Preta Pretinha comercia em média 1.200 bonecos por mês. O mais barato é o mini boneco de 8 cm (R$ 10), e o mais caro é a boneca Mariah (tem 49 cm e é

o carro-chefe da loja), que sai por R$ 198.

A loja também produz bonecos personalizados que são feitos sob medida e ficam mais caros. Entre os trabalhos das irmãs estão os personagens João e Maria

dos dois livros do ator Lázaro Ramos: Caderno de Rimas de João e Caderno sem Rimas de Maria.

Além do estabelecimento comercial, as irmãs mantêm o Instituto Preta Pretinha e dão palestras sobre africanidade em escolas públicas.

Fonte: R7

Nenhum comentário:

Postar um comentário