segunda-feira, 16 de junho de 2014
Demonstração do exoesqueleto decepciona na cerimônia de abertura
Em 3 segundos, o projeto de 156 cientistas de 25 países comandados pelo
brasileiro Miguel Nicolelis mostrou seus resultados. Leia a repercussão
entre cadeirantes
e a comunidade científica mundial.
Rita Loiola
Em um flash de 3 segundos, o paraplégico Juliano Pinto, de 29 anos,
usando uma veste robótica que seria comandada pelo cérebro, moveu seu pé
direito e
deu um pequeno chute em uma bola de futebol durante a cerimônia de
abertura da Copa do Mundo, nesta quinta-feira. Antes do espetáculo
musical que apresentou
a faixa-título da Copa, a demonstração esperada desde 2011 por
paraplégicos de todo o mundo e que consumiu 33 milhões de reais, boa
parte vinda do governo
federal, foi vista apenas de relance. Em pé, Juliano, vestindo a
estrutura metálica que pesa 70 quilos e apoiado por duas pessoas,
mostrou o resultado
do trabalho de 156 cientistas de 25 países que, liderados pelo
neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, viabilizaram a demonstração
no início do campeonato.
O esperado era que um paraplégico, usando o exoesqueleto, levantasse de
sua cadeira de rodas, desse alguns passos no gramado e então chutasse a
bola para
dar início aos jogos. Nicolelis, cientista da Universidade de Duke, nos
Estados Unidos, lançou o projeto Andar de Novo para fazer uma veste
robótica de
metal leve que leria os sinais elétricos emitidos pelo cérebro de um
paraplégico e faria com que ele andasse. Por meio de um sistema chamado
interface
cérebro-máquina (ICM), os sinais enviados pelo cérebro seriam captados
por uma touca repleta de eletrodos de eletroencefalograma (EEG) e
enviados a um
computador em uma mochila, nas costas do robô. Ali, eles seriam
traduzidos e transformados em comandos de movimento. Giroscópios
acoplados às costas do
robô garantiriam o equilíbrio do exoesqueleto.
Oito pessoas teriam participado dos testes, que teriam se iniciado em
novembro e foram divulgados em uma página do Facebook e no Portal da
Copa. Uma das
novidades anunciadas pelos cientistas que projetaram a estrutura é que
ela faria os jovens sentirem a sensação de contato com o solo, como se
ele fosse
percebido pelos pés. Sensores acoplados aos pés do robô enganariam a
mente, passando a informação da proximidade do chão como se ela viesse
do corpo. Com
isso, a ideia da equipe responsável pelo projeto é que o exoesqueleto
fosse compreendido pelo cérebro e controlado como mais um membro do
organismo.
"Foi um grande trabalho de equipe e destaco, especialmente, os oito
pacientes, que se dedicaram intensamente para este dia. Coube a Juliano
usar o exoesqueleto,
mas o chute foi de todos. Foi um grande gol dessas pessoas e da nossa
ciência", celebrou Nicolelis, coordenador científico do projeto, em um
comunicado
à imprensa.
Confira a repercussão entre cadeirantes e a comunidade científica mundial:
"Somos a favor de avanços tecnológicos e pesquisas científicas, mas não
podemos concordar com a 'espetacularização' de uma tecnologia incipiente
e que
não está madura para produção em massa. A exposição causará falsas
expectativas nas pessoas com deficiência e reforçará estigmas negativos
e preconceitos.
Não me parece promissor, não ajudará pessoas com deficiência a voltarem
a andar e não será utilizado no dia a dia (tanto pelo custo impraticável
como pela
falta de autonomia). Finalmente, parece-me absurdo investir mais de 33
milhões de reais (boa parte de recursos públicos) em algo que não trará
benefícios
ou soluções. Agrego a tudo isso profunda decepção com a participação do
exoesqueleto na cerimônia de abertura, que acabo de assistir. Sem
dúvida, a demonstração
evidenciou que o experimento não funciona e não atendeu sequer as
promessas divulgadas. Decepcionante!"
Luiz Portinho, advogado gaúcho e presidente da Rio Grande do Sul
Paradesporto
"Vi algumas demonstrações do exoesqueleto nos Estados Unidos, em versões
preliminares. No entanto, é muito grande e não serve para todos. Acho
que ele
deve ser combinado com estímulos elétricos para promover movimentos mais
ativos, em vez dos completamente passivos. É um bom começo e beneficiará
várias
pessoas com deficiência."
Paul Lu, cientista americano paraplégico que pesquisa o uso de
células-tronco para lesões de medula na Universidade da Califórnia em
San Diego (UCSD),
nos Estados Unidos
"O que foi exibido ao mundo, infelizmente, é tudo o que já se sabia do
exoesqueleto: uma dúvida profunda a respeito de todos os seus
potenciais, desdobramentos
e capacidades. A questão, agora, não é mais ser cético em relação a um
avanço científico que pode revolucionar vidas, é cobrar vigorosamente
seriedade
e luminosidade com promessas que envolvam dinheiro público, almas
angustiadas e anseios de milhões de pessoas."
Jairo Marques, jornalista, cadeirante paulistano e colunista do jornal
Folha de S.Paulo
"Esse pequeno chute é um grande passo para a ciência, que mostra que o
homem é capaz de sonhar e de tentar colocar em prática seus sonhos. No
entanto,
acredito que pesquisas como a estimulação elétrica, feita por
pesquisadores brasileiros, é uma maneira bem mais inteligente de
recuperar os movimentos
dos paraplégicos. São duas frentes de estudos que podem fazer com que
pessoas com lesões medulares possam realizar o sonho de voltar a andar."
Benny Schimidt, chefe do laboratório de patologia neuromuscular da
Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)
"A demonstração é um ato simbólico do esforço para usar a ciência e a
robótica moderna no lugar da tecnologia centenária das cadeiras de
rodas. Podemos
e devemos superar essa era antiga e fazer algo melhor. Nicolelis e seus
colegas estão, claramente, dando um passo nessa direção. O mais
importante é que
essa tecnologia possa se tornar prática e útil para pessoas com lesões e
que ela seja tão confiável e efetiva quanto uma cadeira de rodas.
Veremos no futuro
se esse será ou não o caso.”
Mark Tuszynski, neurocientista americano e diretor do Center for Neural
Repair da Universidade da Califórnia em San Diego (UCSD), nos Estados Unidos
"A demonstração é positiva, pois chama a atenção para os paraplégicos.
No entanto, é um show para abertura da Copa, sem mostrar grandes avanços
científicos.
Em 2012, uma paraplégica correu uma maratona com um exoesqueleto e essa
não é uma tecnologia nova. Além disso, a estrutura é muito pesada, de 70
quilos
e, se houver uma queda, isso pode levar a graves lesões — pessoas com
lesões medulares costumam ter osteoporose e qualquer queda é perigosa. O
exoesqueleto
não vai resolver o problema de quem tem lesões medulares."
Alberto Cliquet Júnior, professor titular do departamento de Ortopedia e
Traumatologia da Unicamp e de Engenharia Elétrica na Universidade de São
Paulo
(USP)
"Mesmo depois da demonstração não fica muito claro se isso será um
avanço. A ciência, tradicionalmente, é movida por cientistas que
publicam suas descobertas
em revistas científicas rigorosas que promovem uma análise justa dos
feitos dos cientistas. Isso ainda não foi feito com o projeto Andar de
Novo. Estou
curioso para o momento em que isso seja feito e então cientistas e
engenheiros poderão avaliar os progressos que esse time fez."
Daniel Ferris, neurocientista e professor da Universidade de Michigan,
nos Estados Unidos
¤
Demonstração do exoesqueleto decepciona na cerimônia de abertura
Veja
13/06/2014
Em 3 segundos, o projeto de 156 cientistas de 25 países comandados pelo
brasileiro Miguel Nicolelis mostrou seus resultados. Leia a repercussão
entre cadeirantes
e a comunidade científica mundial.
Rita Loiola
Em um flash de 3 segundos, o paraplégico Juliano Pinto, de 29 anos,
usando uma veste robótica que seria comandada pelo cérebro, moveu seu pé
direito e
deu um pequeno chute em uma bola de futebol durante a cerimônia de
abertura da Copa do Mundo, nesta quinta-feira. Antes do espetáculo
musical que apresentou
a faixa-título da Copa, a demonstração esperada desde 2011 por
paraplégicos de todo o mundo e que consumiu 33 milhões de reais, boa
parte vinda do governo
federal, foi vista apenas de relance. Em pé, Juliano, vestindo a
estrutura metálica que pesa 70 quilos e apoiado por duas pessoas,
mostrou o resultado
do trabalho de 156 cientistas de 25 países que, liderados pelo
neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, viabilizaram a demonstração
no início do campeonato.
O esperado era que um paraplégico, usando o exoesqueleto, levantasse de
sua cadeira de rodas, desse alguns passos no gramado e então chutasse a
bola para
dar início aos jogos. Nicolelis, cientista da Universidade de Duke, nos
Estados Unidos, lançou o projeto Andar de Novo para fazer uma veste
robótica de
metal leve que leria os sinais elétricos emitidos pelo cérebro de um
paraplégico e faria com que ele andasse. Por meio de um sistema chamado
interface
cérebro-máquina (ICM), os sinais enviados pelo cérebro seriam captados
por uma touca repleta de eletrodos de eletroencefalograma (EEG) e
enviados a um
computador em uma mochila, nas costas do robô. Ali, eles seriam
traduzidos e transformados em comandos de movimento. Giroscópios
acoplados às costas do
robô garantiriam o equilíbrio do exoesqueleto.
Oito pessoas teriam participado dos testes, que teriam se iniciado em
novembro e foram divulgados em uma página do Facebook e no Portal da
Copa. Uma das
novidades anunciadas pelos cientistas que projetaram a estrutura é que
ela faria os jovens sentirem a sensação de contato com o solo, como se
ele fosse
percebido pelos pés. Sensores acoplados aos pés do robô enganariam a
mente, passando a informação da proximidade do chão como se ela viesse
do corpo. Com
isso, a ideia da equipe responsável pelo projeto é que o exoesqueleto
fosse compreendido pelo cérebro e controlado como mais um membro do
organismo.
"Foi um grande trabalho de equipe e destaco, especialmente, os oito
pacientes, que se dedicaram intensamente para este dia. Coube a Juliano
usar o exoesqueleto,
mas o chute foi de todos. Foi um grande gol dessas pessoas e da nossa
ciência", celebrou Nicolelis, coordenador científico do projeto, em um
comunicado
à imprensa.
Confira a repercussão entre cadeirantes e a comunidade científica mundial:
"Somos a favor de avanços tecnológicos e pesquisas científicas, mas não
podemos concordar com a 'espetacularização' de uma tecnologia incipiente
e que
não está madura para produção em massa. A exposição causará falsas
expectativas nas pessoas com deficiência e reforçará estigmas negativos
e preconceitos.
Não me parece promissor, não ajudará pessoas com deficiência a voltarem
a andar e não será utilizado no dia a dia (tanto pelo custo impraticável
como pela
falta de autonomia). Finalmente, parece-me absurdo investir mais de 33
milhões de reais (boa parte de recursos públicos) em algo que não trará
benefícios
ou soluções. Agrego a tudo isso profunda decepção com a participação do
exoesqueleto na cerimônia de abertura, que acabo de assistir. Sem
dúvida, a demonstração
evidenciou que o experimento não funciona e não atendeu sequer as
promessas divulgadas. Decepcionante!"
Luiz Portinho, advogado gaúcho e presidente da Rio Grande do Sul
Paradesporto
"Vi algumas demonstrações do exoesqueleto nos Estados Unidos, em versões
preliminares. No entanto, é muito grande e não serve para todos. Acho
que ele
deve ser combinado com estímulos elétricos para promover movimentos mais
ativos, em vez dos completamente passivos. É um bom começo e beneficiará
várias
pessoas com deficiência."
Paul Lu, cientista americano paraplégico que pesquisa o uso de
células-tronco para lesões de medula na Universidade da Califórnia em
San Diego (UCSD),
nos Estados Unidos
"O que foi exibido ao mundo, infelizmente, é tudo o que já se sabia do
exoesqueleto: uma dúvida profunda a respeito de todos os seus
potenciais, desdobramentos
e capacidades. A questão, agora, não é mais ser cético em relação a um
avanço científico que pode revolucionar vidas, é cobrar vigorosamente
seriedade
e luminosidade com promessas que envolvam dinheiro público, almas
angustiadas e anseios de milhões de pessoas."
Jairo Marques, jornalista, cadeirante paulistano e colunista do jornal
Folha de S.Paulo
"Esse pequeno chute é um grande passo para a ciência, que mostra que o
homem é capaz de sonhar e de tentar colocar em prática seus sonhos. No
entanto,
acredito que pesquisas como a estimulação elétrica, feita por
pesquisadores brasileiros, é uma maneira bem mais inteligente de
recuperar os movimentos
dos paraplégicos. São duas frentes de estudos que podem fazer com que
pessoas com lesões medulares possam realizar o sonho de voltar a andar."
Benny Schimidt, chefe do laboratório de patologia neuromuscular da
Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)
"A demonstração é um ato simbólico do esforço para usar a ciência e a
robótica moderna no lugar da tecnologia centenária das cadeiras de
rodas. Podemos
e devemos superar essa era antiga e fazer algo melhor. Nicolelis e seus
colegas estão, claramente, dando um passo nessa direção. O mais
importante é que
essa tecnologia possa se tornar prática e útil para pessoas com lesões e
que ela seja tão confiável e efetiva quanto uma cadeira de rodas.
Veremos no futuro
se esse será ou não o caso.”
Mark Tuszynski, neurocientista americano e diretor do Center for Neural
Repair da Universidade da Califórnia em San Diego (UCSD), nos Estados Unidos
"A demonstração é positiva, pois chama a atenção para os paraplégicos.
No entanto, é um show para abertura da Copa, sem mostrar grandes avanços
científicos.
Em 2012, uma paraplégica correu uma maratona com um exoesqueleto e essa
não é uma tecnologia nova. Além disso, a estrutura é muito pesada, de 70
quilos
e, se houver uma queda, isso pode levar a graves lesões — pessoas com
lesões medulares costumam ter osteoporose e qualquer queda é perigosa. O
exoesqueleto
não vai resolver o problema de quem tem lesões medulares."
Alberto Cliquet Júnior, professor titular do departamento de Ortopedia e
Traumatologia da Unicamp e de Engenharia Elétrica na Universidade de São
Paulo
(USP)
"Mesmo depois da demonstração não fica muito claro se isso será um
avanço. A ciência, tradicionalmente, é movida por cientistas que
publicam suas descobertas
em revistas científicas rigorosas que promovem uma análise justa dos
feitos dos cientistas. Isso ainda não foi feito com o projeto Andar de
Novo. Estou
curioso para o momento em que isso seja feito e então cientistas e
engenheiros poderão avaliar os progressos que esse time fez."
Daniel Ferris, neurocientista e professor da Universidade de Michigan,
nos Estados Unidos
fonte:veja
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