sexta-feira, 28 de março de 2014
Iniciado treinamento de audiodescritores para a copa FIFA 2014
"Para que um deficiente visual tenha a experiência completa em um
estádio de futebol, ele precisa entender o que acontece no gramado e ao
seu redor". Foi
com essas palavras de Joyce Cook, diretora geral do Centro de Acesso ao
Futebol na Europa (Centre for Access to Football in Europe - CAFE), que
a Copa
do Mundo da FIFA 2014 deu o pontapé inicial na parte prática de um
projeto inovador no Brasil.
Arnaldo César Coelho
Preocupados em melhorar a experiência de cegos e pessoas com baixa visão
nos estádios, a FIFA e o COL oferecerão um serviço pioneiro de narração
audiodescritiva
em quatro estádios da Copa do Mundo da FIFA no Brasil. Nesta
quarta-feira, no estádio Maracanã, no Rio de Janeiro, foi iniciado o
seminário de treinamento
de narradores voluntários.
A audiodescrição é semelhante à narração de rádio, mas com ênfase na
experiência do estádio. O narrador especialmente treinado fornece uma
descrição adicional
de todas as informações visuais significativas, como linguagem corporal,
expressão facial, entorno, lances, uniformes, cores e qualquer outro
aspecto importante
para transmitir a aparência e o ambiente do estádio. "O serviço de
audiodescrição fala como a torcida está se portando, quais são as
brincadeiras, como
o juiz corre… Algumas coisas que ninguém acha que são importantes,
porque estão todos vendo", diz Anderson Dias, presidente da Urece
Esporte e Cultura
para Cegos, ONG parceira da FIFA e do COL que trabalha com projetos
especiais para pessoas com deficiência visual. "Na audiodescrição de
avaliação de voluntários,
ouvi o gol do Ronaldo na final da Copa do Mundo de 2002 e ouvi que o
Oliver Kahn fica no chão, chateado, triste, e o Ronaldo sai comemorando
de braços
abertos. Isso se perde nas transmissões de TV e rádio", completa Dias,
que foi bicampeão mundial e campeão paralímpico de Futebol de 5 em
Atenas 2004.
Convidado especial do primeiro dia do seminário, o árbitro Arnaldo Cézar
Coelho, que comandou a final da Copa do Mundo da FIFA Espanha 1982,
provocou risos
na plateia ao revelar que já foi chamado de cego por muitos torcedores e
se mostrou encantado com a iniciativa. Ele falou aos voluntários sobre a
importância
de se conhecerem as reações de um árbitro. "Ter a FIFA se preocupando
com os deficientes visuais em campo é muito legal. Melhor ainda é ter um
narrador
para explicar e comentar todas emoções de um jogo de Copa do Mundo.
Minha presença foi para explicar as reações que os árbitros têm, para
que os narradores
orientem seus ouvintes. É uma iniciativa brilhante da FIFA. Nunca tinha
visto isso."
A narração audiodescritiva será disponibilizada em português em quatro
estádios da Copa do Mundo da FIFA: Belo Horizonte (Estádio Mineirão),
Brasília (Estádio
Nacional de Brasília), Rio de Janeiro (Estádio do Maracanã) e São Paulo
(Arena de São Paulo). Haverá dois locutores por jogo, e a narração será
transmitida
por radiofrequência e captada em fones de ouvido individuais. Torcedores
cegos ou com baixa visão podem sentar-se em qualquer lugar do estádio.
No total, pelo menos 16 voluntários, quatro de cada uma das cidades-sede
selecionadas, passarão por um programa de treinamento intensivo
promovido pelo
CAFE e pela Urece. Após a conversa com Arnaldo Cézar Coelho, os
voluntários foram orientados em um exercício no qual tiveram de guiar e
serem guiados por
companheiros enquanto percorriam as instalações do Maracanã. O exercício
fez com que muitos percebessem as dificuldades de visitar um local sem
enxergar
e, ao mesmo tempo, reconhecessem a responsabilidade de descrever a um
cego tudo o que está a seu redor.
A voluntária Natália Caldeira, de 29 anos, que trabalha com deficientes
visuais desde 2004, comemorou a chance de participar desse projeto na
Copa do Mundo
da FIFA em seu país. "É uma oportunidade incrível. Não só de estar num
jogo de Copa, mas de transmitir a essas pessoas o que acontece e tornar
sua experiência
mais real. É uma responsabilidade muito grande, mas tenho certeza de que
a gente vai ter diversas lições até lá e vai conseguir fazer isso
direitinho.
Estou preparada".
Tão importante quanto o aspecto inovador do projeto em solo brasileiro é
seu legado. Após a Copa do Mundo da FIFA Brasil 2014, o equipamento de
narração
instalado em cada estádio será doado às entidades locais dispostas a
fazer parte do legado do projeto. "O mais interessante é o legado humano
que estamos
deixando: esses voluntários estão recebendo o conhecimento sobre como
passar a narração para pessoas que são cegas ou com baixa visão",
ressalta Paula
Gabriela Freitas, líder da Equipe de Sustentabilidade da FIFA no Brasil.
"São brasileiros que vão ficar aqui e vão poder, depois, realizar esse
serviço
não somente em jogos ou eventos esportivos, mas em eventos culturais e
de outros tipos".
Joyce Cook, do CAFE, reforça o discurso e mostra objetivos ambiciosos
para o Brasil. "Nossa vontade é ver todos os estádios e arenas
esportivas do Brasil
com este serviço; que se torne algo normal. Que pessoas cegas e com
deficiência visual possam ir a eventos esportivos com naturalidade,
ouvindo o serviço
de narração audiodescritiva e tendo o serviço completo".
As pessoas com deficiência representam pelo menos 12% da população
mundial: são mais de 840 milhões de pessoas com deficiência, das quais
285 milhões são
cegas ou têm visão subnormal. Até o momento, pouquíssimos locais no
Brasil oferecem serviços para pessoas cegas ou com baixa visão que
comparecem a eventos
ao vivo, como jogos de futebol. Para a Copa do Mundo da FIFA Brasil
2014, e de acordo com as leis brasileiras, pelo menos 1% do número total
de ingressos
oferecidos é disponibilizado para pessoas com deficiência – e todas elas
podem solicitar bilhetes complementares para um acompanhante. Os
estádios da Copa
do Mundo da FIFA são acessíveis a pessoas com deficiência, pessoas com
mobilidade reduzida e pessoas obesas. Assentos acessíveis, banheiros e
passarelas
estão disponíveis. Há entradas exclusivas para pessoas com deficiência
ao lado dos acessos para pessoas sem deficiência.
Fonte: FIFA
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