sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

Dia Nacional da Pessoa com Deficiência Visual: Friburgo longe da acessibilidade

Agências bancárias e prédios públicos ainda não estão suficientemente adaptados
POR PAULA VALVIESSE (
PAULA@AVOZDASERRA.COM.BR)

No meio da calçada, uma escada: um dos vários exemplos de obstáculos para os deficientes visuais em Friburgo (Arquivo AVS)
Em um bate-papo descontraído, os frequentadores da Associação Friburguense de Integração ao Deficiente Visual (Afridev) comentam sobre o Dia Nacional da

Pessoa com Deficiência Visual, celebrado nesta quinta-feira, 13. A presidente da instituição, Wanda Maduro, e os membros Yvone Marques Moreira, Célio Reis,

Heraldo César Schettini e Gláucia Marques, todos deficientes visuais, são enfáticos em dizer que Nova Friburgo ainda precisa melhorar muito no quesito

acessibilidade e se colocam à disposição para quem quiser saber mais sobre os desafios diários enfrentados por eles no município.

Apesar de muitos dos problemas destacados terem legislação específica para garantir a mobilidade e a acessibilidade não só dos deficientes visuais, mas

de todas as pessoas com necessidades especiais, muito do que está escrito não é cumprido. Uma forma de compreender isso e acompanhando um deficiente visual

em uma volta pela cidade para executar ações simples, como ir ao banco ou se deslocar pelas ruas do centro para chegar à sede da associação, que fica na

Rua Augusto Spinelli, 114, sala 107.

Auxílio de voz e inscrições em Braille

Começando o passeio, o primeiro exemplo é a garantia de sinalização em Braille e por uso de voz, em elevadores. Esse recurso é obrigatório para os prédios

públicos e os construídos após vigência da lei, assim como existe a necessidade de adaptação para os prédios antigos, mas não é algo tão comum como se

imagina:

“No meu prédio os elevadores são divididos em acesso aos andares pares e ímpares. No ímpar já existe identificação por voz e numeração em braille, mas

no par é só a numeração. Mas isso não é visto. Até mesmo agências bancárias e prédios públicos não estão adaptados a esse modelo de acessibilidade”, conta

Yvone.

E não é só o elevador, as escadas também precisam atender a essas pessoas: “Um corrimão faz toda a diferença pra gente”, completa Yvone.

Usar sistemas que exigem retirada de senhas é outra missão enfrentada pelos deficientes visuais. O problema, usando como exemplo locais de prestação de

serviço, como bancos e agências dos correios, é que existe um sinal sonoro que informa que uma nova senha está sendo chamada, mas nem em todos os locais

esse número é anunciado:

“Você entra no banco, retira a senha, pede alguém para ler o número, mas enquanto aguarda, não tem como saber se é o seu número que está sendo chamado,

pois não diz isso e nem qual caixa buscar”, afirma Wanda.

Mas existem também os locais adaptados: “Esses dias estive na Agência dos Correios, na praça Getúlio Vargas, e fiquei surpresa ao ouvir que o identificador

de senhas deles diz o número do caixa. Como de costume, estava em pé aguardando a minha vez, mas ao ouvir chamar e perceber que existe essa acessibilidade,

pude sentar e aguardar tranquilamente”, conta Jaqueline Dutra.

E as senhas assombram também quem deseja fazer um lanche na rua. Nos shoppings, por exemplo, quando não há serviço de garçom, o próprio consumidor deve

aguardar a sua vez para retirar o pedido, mas como saber isso se a senha não é chamada, só apita? Uma forma encontrada por alguns estabelecimentos é o

uso de fichas que vibram quando o pedido está pronto: “Ainda são poucos os locais que possuem, mas é uma maneira simples de garantir a inclusão do deficiente

visual”, afirma Célio.

Piso tátil e guia de bengala

Não basta saber onde deseja ir, tem que conseguir chegar ao local. E uma forma de garantir esse deslocamento autônomo para os deficientes visuais é com

uso da sinalização devida. No município, as calçadas são um grande risco para quem não enxerga e possui pouquíssimos trechos adaptados, como contam os

membros da Afridev:

“As calçadas são um perigo até para quem enxerga, imagina para o deficiente visual”, diz rindo, Heraldo, que apesar da graça, considera o assunto de extrema

importância para todos. E complementa: “Não somos só nós, cadeirantes e até pessoas com carrinho de bebê também são prejudicadas com esse descaso. O ideal

seria que todos fizessem a sua parte, como manda a lei”.

E os obstáculos vão além da ausência do piso especial e dos buracos: “Temos problemas com carros estacionados com as quatro rodas em cima das calçadas

ou quando não são os veículos, são os vasos de plantas colocados para impedir que isso aconteça. Alguns vasos são enormes e as plantas usadas espetam a

gente, machucam. E tem ainda mostruários de lojas, mesas e cadeiras dos comércios. Nisso, o que falta mesmo é uma fiscalização rigorosa dos órgãos competentes”,

afirma Wanda.

E o piso especial não é a única solução: “As calçadas deveriam ter uma guia de bengala, que é uma espécie de ‘vala’ para auxiliar”, explica a presidente.


Mas desviar dos obstáculos é apenas uma parcela do percurso, tem ainda as pessoas que não prestam atenção e acabam esbarrando no deficiente visual: “Esses

dias estava chovendo e uma mulher bateu com a sombrinha no meu rosto. Ela então se virou e exclamou: ‘Não enxerga, não?!’, no que meu marido respondeu

que não, que eu era deficiente visual. As pessoas se distraem, especialmente no celular e desrespeitam o espaço do outro”, diz Gláucia.

Sinal sonoro de trânsito

Para o deficiente visual que caminha sozinho pela cidade, o trânsito é outro grande desafio. O ideal seria que todos os semáforos (e isso inclui o país

inteiro, já que depende de legislação federal) tivessem orientação sonora para travessia. Mas, enquanto isso não acontece, o jeito é solicitar a ajuda

do próximo para atravessar a rua sem correr riscos:

“Há 14 anos conseguimos, por meio de um conselho de pessoas com deficiência que existia na época, um sinal sonoro que foi instalado na esquina da Alberto

Braune com a Rua Sete. Mas colocaram no local um sinal 110V, que queimou tão logo foi ligado e nunca substituíram”, relatou Wanda.

Os caminhos levam à Afridev

Mesmo em face de tantos obstáculos, a vontade de contribuir com ideias para melhorar a acessibilidade é imensa. Complementando o lema da instituição, que

diz “Se você conhece um deficiente visual, ensine a ele o caminho da Afridev”, eles reforçam:

“Estamos abertos a todos que queiram saber mais sobre as nossas dificuldades diárias e temos muitas ideias a respeito de acessibilidade, que exigem pouco,

mas que fazem uma grande diferença. Nossa cidade tem muitas coisas boas, a maior parte das pessoas está disposta a ajudar. Então, nessa data, destacamos

a importância da parceria para um futuro melhor”, conclui Wanda.
fonte Logotipo Jornal A Voz da Serra

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