segunda-feira, 2 de março de 2015
Estudante usa dança cigana para melhorar autoestima de deficientes
Regina Borges realiza trabalho com dez cadeirantes em Luziânia, GO. Iniciativa virou pesquisa acadêmica.
Regina Borges realiza trabalho com dez cadeirantes em Luziânia, GO. Iniciativa virou pesquisa acadêmica.
A estudante de assistência social Regina Borges, 43 anos, pratica dança cigana há mais de 20 anos e decidiu usar a técnica para melhorar a qualidade de
vida de portadores de deficiência de
Luziânia,
no Entorno do Distrito Federal. Ela fundou o grupo “Bailando com a Vida”, no qual dez cadeirantes participam ativamente das coreografias. O resultado obtido
com o trabalho virou uma pesquisa acadêmica, e o resultado foi apresentado durante um congresso em São Paulo.
Regina conta que sempre foi apaixonada pela dança cigana e, quando estava no palco, pensava em como era realizada por poder executar os passos. No começo
de 2010, antes de fundar o grupo, ela esteve em um teatro de Brasília, onde assistiu a uma apresentação de pessoas em cadeira de rodas. “Eles dançavam
um estilo mais clássico, mas foi tudo muito lindo. Aí eu pensei que a dança cigana se encaixaria muito bem, já que ela exige muitos movimentos com os braços,
o que é plenamente possível aos cadeirantes”, lembra.
Em março daquele ano, ela iniciou o projeto em Luziânia, cidade com aproximadamente 174.500 habitantes, segundo dados do Censo 2010 do Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE). Destes, mais de 22% apresentam algum tipo de deficiência. Ao pesquisar sobre o tema, Regina decidiu, então, criar um
grupo no município, mas conta que enfrentou um pouco de resistência. “Eu passei a divulgar o meu projeto, mas ninguém parecia se interessar. Até que o
primeiro cadeirante apareceu e trouxe um amigo e assim por diante. Atualmente, são dez integrantes que tiveram suas vidas transformadas”, afirma a estudante.
Projeto científico
A estudante lembra que o trabalho com os deficientes foi iniciado antes de cursar assistência social na Faculdade Anhanguera, em Luziânia. Mas no decorrer
dos anos, os colegas foram se interando sobre o grupo de dança. “Aí, em setembro de 2012, um professor conheceu o meu projeto e me convidou para participar
da iniciação científica”, conta.
Regina montou, então, um questionário com 16 questões, nos quais os cadeirantes responderam sobre aspectos que mudaram nas suas vidas após o grupo de dança.
“O estudo apontou uma melhora significativa na autoestima dos envolvidos e na integração social. A entrada no grupo foi o agente motivador da mudança”,
explica a estudante.
Uma das perguntas feitas ao grupo foi se eles se sentiam inúteis nos grupos sociais a que pertecem. No primeiro questionário, aplicado em janeiro deste
ano, 50% dos cadeirantes disseram “sim”. A mesma pergunta foi aplicada em julho passado, após a intensificação das atividades de dança, e apenas 10% voltaram
a concordar com a realidade. “Isso mostra que houve um avanço muito grande, pois eles puderam enxergar que podem ser inseridos na vida cultural e ter atividades
como qualquer pessoa”, destacou a estudante.
Grupo Bailando com a Vida posa antes de apresentação em Luziânia
Grupo Bailando com a Vida posa antes de apresentação em Luziânia
Bailando com a Vida
Regina explica que o trabalho no grupo basicamente consiste em criar coreografias, nas quais os deficientes estão inseridos. Antes de iniciar, muitos apresentavam
quadros de depressão e receio até de sair de casa. “É comum que a gente tenha medo de novas experiências. Imagine para alguém que tenha alguma deficiência
e lute todos os dias com as dificuldades cotidianas. Quando começamos o trabalho, todos tinham vergonha de se expor ao público e muitos nem tinham mais
expectativa de vida”, conta.
Segundo ela, aos poucos, a realidade dos participantes foi mudando, principalmente em fatores relacionadas à autoestima. “A gente se reúne periodicamente
para os ensaios e durante esses encontros eles, além de se exercitar, podem conversar uns com os outros e trocar experiências. Isso foi enriquecendo a
vida de cada um e hoje os resultados são incríveis. Um deles era tão tímido que mal saía de casa, mas no grupo conheceu uma pessoa e hoje eles são casados”,
lembra a pesquisadora.
O deficiente citado é José Raimundo Silva, 37 anos, que afirma que o Bailando com a Vida lhe trouxe uma nova motivação para seguir em frente. “Participando
do grupo, readquiri autoconfiança. Me sinto capaz de realizar funções que as pessoas sem deficiência realizam. A dança me reabilitou para a vida”, contou
o cadeirante.
Segundo Regina, nestes três anos de existência do grupo, ela pôde comprovar a força da dança como meio importante para devolver a autoestima dos deficientes.
“No grupo tínhamos um participante que era alcoólatra e estava se entregando ao vício. Outro apresentava quadro de depressão e fazia o uso de medicamentos
para controlar o mal. Hoje, todos eles estão bem e aprenderam a lidar melhor com as dificuldades geradas pela deficiência. O Bailando com a Vida virou
uma motivação tanto para eles quanto para mim”, ressalta.
Apesar da iniciativa que ajuda a melhorar a qualidade de vida dos dez moradores de Luziânia, o projeto de Regina ainda segue sem apoio financeiro e tudo
é feito de maneira independente. “Eu mesma providencio as fantasias e agendo as apresentações que iremos fazer. Tudo dá muito trabalho, mas o resultado
é enriquecedor”, afirma.
Segundo ela, até o transporte dos dançarinos para os espetáculos é um desafio. “Sempre temos que alugar vans que nos levem aos locais das apresentações,
mas nem sempre é fácil encontrar pessoas dispostas a levar um grande número de deficientes e suas cadeiras de rodas.”
E é assim que o grupo realiza o trabalho, com muito esforço e recursos próprios. “Já chegamos a pensar em cobrar pelo show, mas a resistência, infelizmente,
ainda é muito grande quando se fala em um grupo de cadeirantes. Mesmo assim, estamos na luta e não vamos desistir de mostrar nosso trabalho”, ressalta
Regina.
Fonte: G1
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